Alguns projetos de economia solidária transformam vidas e se tornam referência no Brasil. É o caso da Lavanderia 8 de Março, em Santos (SP), considerada já há alguns anos pelo economista Paul Singer (então à frente da Secretaria Nacional de Economia Solidária) e pela ambientalista Marina Silva (Rede) um exemplo de iniciativa econômica e social. A proposta da Lavanderia demonstra que as cooperativas, os bancos comunitários e os empreendimentos econômicos solidários, mesmo os informais, são um caminho viável para um Brasil que enfrenta tantos desafios econômicos.
Para além do interesse calcado no lucro, proposta das instituições econômicas tradicionais – como os bancos privados -, as iniciativas de economia solidária levam em conta os impactos sociais e influenciam em outros segmentos da sociedade, promovendo uma nova forma de viver e transformando culturalmente uma comunidade ou até um país.
O projeto
A Lavanderia 8 de Março é gerida por um grupo de seis mulheres que alcançaram a tão sonhada autonomia financeira e emocional. Mais do que um equipamento para lavar a roupa das moradoras, o projeto de inclusão socioeconômica gerou postos de trabalho e de renda. A iniciativa foi da Secretaria de Desenvolvimento Social (SEDS) da Prefeitura de Santos (SP), com apoio inicial da Petrobras.
As lavagens oferecidas têm preços acessíveis e atendem a pessoas físicas e empresas. Em 2009 a ideia ganhou moldes de uma cooperativa, promovendo, além de trabalho, cursos de qualificação na área de lavagem, de atendimento a clientes e de economia solidária. A Lavanderia passou a proporcionar protagonismo para as mulheres e fortalecer as suas lutas. Esse tipo de empreendimento gera uma mudança cultural na vida destas mulheres, que é replicada junto à família e aos filhos e à sociedade, explica Marcia Farah Reis, psicóloga, gestora de políticas públicas de economia solidária e funcionária da Secretaria de Desenvolvimento Social de Santos.
Vidas transformadas
Mulheres em situação de vulnerabilidade e risco pessoal e social trabalham como lavandeiras no equipamento. Mais de 70 mulheres passaram por ali e aprenderam o ofício da higienização de roupas e materiais. “Depois, criaram seu próprio negócio próximo da sua casa ou arrumaram um emprego”, comemora Márcia Farah, gestora do projeto. Por isso, Paul Singer, depois de visitar o empreendimento há alguns anos, recomendou em suas palestras realizadas pelo Brasil que o modelo da iniciativa se replicasse no país. Da mesma forma, Marina Silva elogiou a proposta social da Lavanderia, premiada nacionalmente.
A Lavanderia mantém um fundo rotativo solidário para atender a eventuais necessidades, evitando recorrer a empréstimos de bancos tradicionais. “Esse fundo gera rendimentos e serve para manutenção de equipamentos e também pode ser emprestado a elas, sem taxa de juros, quando precisam consertar suas casas, viajar, ou em outro caso de necessidade. “A cooperativa de crédito ou um empreendimento como a Lavanderia dá essa perspectiva individual. Existe um acordo, um vínculo de confiança”, diz a gestora.
Administração coletiva e autonomia
Na economia solidária existem muitos arranjos de grupos informais que trabalham em torno da gestão do empreendimento, compreendendo como ele funciona, opinando e decidindo sobre os seus rumos de forma democrática. Essa administração coletiva envolve e fortalece o grupo, permitindo que se dediquem para gerar qualidade no trabalho e mais rendimentos para todos, alcançando autonomia financeira.
“A Lavanderia funciona de forma profissional, tal qual uma empresa, porém, não existe patrão e empregado e todas têm voz”, explica a gestora. É um empreendimento autogestionável: há conhecimento, organização para o trabalho e para administrar o dinheiro coletivo. “E a distribuição de renda e autogestão transformam o relacionamento entre as participantes e ajudam a tornar a sociedade mais justa e democrática”.
Empreendimentos como a Lavanderia 8 de Março colaboram para a criação de uma rede local de produção e consumo, promovendo o desenvolvimento do território. E, mais do que gerar renda, valorizam os direitos e promovem a cidadania. Por isso, é importante que a sociedade consuma de quem produz com essa proposta, ao invés de priorizar as grandes empresas voltadas apenas ao lucro. Em um século repleto de desafios econômicos e desigualdade social, urge criar e incentivar experiências de economia solidária no Brasil e no mundo.